A Origem (2)

Publicada em 20/08/2010 às 00:00

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A Origem

obs: Não recomendo a leitura à quem ainda não teve a oportunidade de assistir. Contém spoilers.

Após sair da sala do cinema, tive a certeza de que não seria simples escrever sobre essa obra de Christopher Nolan. De jeito algum eu conseguiria escrever sobre o filme se não o fizesse por partes. Mas como eu dividiria, de forma simples e clara, algo que se mostrara tão (masoquisticamente) complexo? Então, percebi, lembrando das obras anteriores do seu diretor, que, sem dúvida, para compreender A Origem de forma lúcida é necessário conhecer, ao menos um pouco, os trabalhos de um dos melhores e mais racionais diretores da atualidade.

As Obras Anteriores



Following: O primeiro longa-metragem de Christopher Nolan, lançado no já longínquo 1998 e que dura pouco mais de uma hora, narra a história de um escritor, psicologicamente instável, que sai pelas ruas seguindo pessoas incomuns as quais julga serem a matéria-prima dos seus contos. No entanto, uma dessas pessoas é um golpista chamado Cobb (Sim... O mesmo nome do ladrão vivido por Leonardo DiCaprio), que o convence a participar dos seus assaltos. O escritor, deslumbrando-se com o mundo apresentado, encarrega-se de o tomar como sua realidade.

O filme é um quebra-cabeça elaborado cuidadosamente, e um verdadeiro exemplo das obras que viriam na sequência.

Amnésia: A segunda obra de Nolan, lançada em 2000 quando ainda tinha trinta anos de idade, já contava com um elenco estrelado. A história, baseada em um conto do seu irmão (Jonathan Nolan), mostra Leonard (Guy Pearce em uma atuação brilhante) investigando o traumático assassinato de sua esposa. Porém, ele sofre de amnésia anterógrada (aquela que impede a memorização de fatos recentes) adquirida após o trauma.

Além, o longa ficou conhecido como “o filme feito de trás para frente”, isto porque o roteiro dos irmãos Nolan, de forma inusitada, inicia no que normalmente seria o final e caminha em direção ao que normalmente seria o início.

Trabalhando em cima da doença de Leonard e do seu desejo vingativo de encontrar o assassino, Chris Nolan criou uma obra na qual insere, no protagonista, dúvidas quase que inteiramente psicológicas, assim como em Following.

Concorreu a dois Oscars: Melhor Roteiro Original e Melhor Edição.

Insônia: O único onde Nolan não tem participação no roteiro, foi lançado em 2002 e é uma refilmagem adaptada de um filme norueguês.

Will Dormer (Al Pacino) é um detetive que vai para Nightmute, no Alaska, ajudar a investigar o assassinato de uma garota. Durante uma perseguição ao assassino (Robin Williams), Dormer, acidentalmente, mata seu parceiro, Hap Eckhart (Martin Donovan), e incrimina o fugitivo. Em meio a duelos psicológicos constantes, Dormer se vê sem dormir há dias, devido às vinte horas diárias de sol do verão do Alasca e, também, por ver a sua verdade ameaçada pela detetive Ellie Burr (Hilary Swank), encarregada de investigar o assassinato de Hap.

Batman Begins
: Reiniciando a história e reinventando o ambiente do Homem-Morcego, Nolan nos apresenta como Bruce Wayne (Christian Bale), utilizando-se do seu próprio medo, torna-se o Batman. Em meio à dúvidas interiores constantes, o filme tem o poder de humanizar o impossível, e ainda conta com as mesmas questões, em outro ângulo, dos filmes anteriores: O que (ou quem) é a verdade?

Foi indicado ao Oscar de Melhor Fotografia.

O Grande Truque: Baseado no livro escrito por Christopher Priest, o filme relata a rivalidade entre dois mágicos brilhantes, Robert Angier e Alfred Borden (intensamente vividos por Hugh Jackman e Christian Bale, respectivamente) em busca da mágica perfeita. O duelo entre verdades está mais uma vez presente, mas, ao final nos é apresentada a única, comovente, e racional verdade... O verdadeiro Grande Truque.

Concorreu aos Oscars de Fotografia e Direção de Arte.

Batman – O Cavaleiro das Trevas: Extraindo o possível da dupla personalidade de Bruce Wayne e trazendo à trama o personagem anarquista e altamente volúvel do Coringa (Heath Ledger em uma das interpretações mais impressionantes do cinema), Nolan se aprofunda o bastante para elevar seu filme a um patamar nunca alcançado por um filme de super-herói.

Foi indicado aos Oscars de  Melhor Direção de Arte, Melhor Fotografia, Melhor Edição, Melhor Maquiagem, Melhor Som e Melhores Efeitos Visuais.

Venceu nas categorias Melhor Ator Coadjuvante (póstumo para Heath Ledger) e Melhor Edição de Som.

A Origem d´A Origem

É notável que, desde o início de sua carreira, Christopher Nolan procura (e consegue) trabalhar em sua área de domínio: a mente humana. Não é (ainda?) um cineasta que procura arriscar nas mais variadas possibilidades temáticas. Seus filmes poderiam, certamente, tornarem-se repetitivos, cansativos, entediantes... Mas não o são. Não o são porque Nolan tem conseguido extrair tudo que lhe convém de cada sub-tema que desenvolve em seus filmes.

Servindo como um laboratório de sua experiência, A Origem reúne com extrema competência os temas já expostos em suas obras passadas, desde a escolha entre realidades do escritor de Following, passando por lapsos de memória de Amnésia, duelos e discussões sobre verdades de Insônia e O Grande Truque, e conflitos internos de Batman (Begins e O Cavaleiro das Trevas). Mas também vai além.

Carregado de conceitos intrigantes e envolventes, o longa dedica suas mais de duas horas a aprofundá-los até um limite possível e compreensível. Sem por um só momento duvidar da inteligência do espectador (o que é de praxe nos filmes de Nolan), o filme pode chegar, em certos pontos, a confundir, mas são situações momentâneas sempre aclaradas, inclusive, pelas dúvidas dos próprios personagens. Em um dado momento, Ariadne (Ellen Page) questiona: “Agora estamos entrando no inconsciente de quem, mesmo?”.

E é, confiando na capacidade de raciocínio de quem assiste, que, tampouco a narrativa procura ser simples. Contando com a premissa de “sonhos dentro de sonhos” (exposta já na sequência inicial), somos apresentados a esses diferentes níveis oníricos e, sem demora, aos seus tempos próprios.

Mantendo seu respeito ao espectador até o fim da projeção, não interrompendo o curso natural da história para “mastigar” os acontecimentos, Nolan expõe ao público o resultado de um desenvolvimento de oito anos, e que, portanto, além de carregar características dos seus seis trabalhos anteriores, também entregou ferramentas para que os três seguintes ao Insônia fossem desenvolvidos.

Aliás... O que representaria melhor o conceito de “sonhos dentro de sonhos” se não a própria obra de Nolan? Não posso me conter em afirmar que A Origem é o ápice de uma obra sólida e fortemente relacionada. Por outro lado, vejo-me impotente para induzir uma barreira limitatória ao universo tão prolífico como a mente dentro da mente de Christopher Nolan. Já disse, certa vez, Orson Welles: "O cinema não tem fronteiras nem limites... É um fluxo constante de sonhos."

Os Personagens



Leonardo DiCaprio é Dominic Cobb, O Extrator. É o líder e quem tem a tarefa de persuadir a vítima, dentro dos sonhos, a compartilhar o que for necessário. Também é ele quem põe em risco as missões, projetando, em seus sonhos, a imagem de sua falecida mulher, Mal (Marion Cottilard). Seu nome é reminescente do ladrão Cobb, de Following, que possuia, igualmente, o poder da persuasão. Por sua vez, Cobb também foi um pensador da psicologia que afirmava: “tudo não passa de codificações criadas pela mente.”

Marion Cottilard, com a eficiência costumeira, interpreta Mal, A Sombra, a esposa (falecida) de Dom Cobb. É ela quem protagoniza algumas (das várias) reviravoltas do enredo. Certamente, seu nome é passível à conclusões diversas, não sendo uma palavra essencialmente portuguesa, e estando presente em inúmeras obras filosóficas e religiosas.

Joseph Gordon-Levitt é Arthur, O (intraduzível) ‘Point Man’. Parceiro e amigo de Cobb, é o encarregado de dar ação à ação. Demonstrando uma formidável solidez, Gordon-Levitt consegue conquistar o espectador, e surpreender quem o lembrava apenas como um ator de comédias-românticas. Seu nome, provavelmente, vem da intimidade de Christopher Nolan com a obra do filósofo Arthur Schopenhauer. Este, por sua vez, chegou a postular que o mundo não é mais que Representação.

Ellen Page é Ariadne, A Arquiteta. Seu principal trabalho é criar o mundo sonhado da forma mais coerente e real possível. Em sua primeira aparição, vê-se obrigada por Cobb a desenhar um labirinto que ele sinta dificuldade para achar a saída. Ariadne, na mitologia grega, é filha do rei Minos, de Creta. É ela quem ajuda Teseu a escapar do labirinto do Minotauro. Há outros fatores que podem ficar abertos às discussões. Teseu só escaparia do labirinto ajudado pelo amor. Ele escapa, com a ajuda de Ariadne, e volta com ela para sua terra. Porém, ele não sente o mesmo amor que recebe. Em A Origem, Page, brilhantemente, demonstra o que começa a sentir por Cobb com seu olhar e, ao final, é ela quem o liberta. Mas Cobb em nenhum momento demonstra qualquer sentimento recíproco.



Tom Hardy é Eames, O Falsificador. É ele quem assume a forma das pessoas de maior confiança da vítima para que o segredo seja revelado. Hardy é o principal destaque do elenco, mesmo com um menor tempo em cena. Cativa com seu humor e, ao mesmo tempo, oferece uma segurança sensitiva ao espectador. Seu nome oferece algumas interpretações, porém o mais provável é que Nolan tenha se referido ao casal Charles e Ray Eames, que ficou conhecido como o “casal dos sonhos” do designer americano. Inclusive, em um dos momentos cômicos de A Origem, Eames percebe a dificuldade de Arthur em um tiroteio e, para ajudar, aparece com um lança-foguete e afirma algo como “é preciso pensar grande às vezes.” Afirmação que, indubtavelmente, coincide com a ascensão do casal de designers.

Ken Watanabe é Saito, O Turista. O título dado por Nolan se deve ao fato de que, mesmo participando das operações da equipe, Saito só o faz porque é o contratante e quer ter a certeza que seu investimento estará sendo levando a sério. Mesmo não possuindo um papel importante dentro do grupo, O Turista é fundamental para a narrativa. Seu nome está ligado a Hajime Saito, que foi um capitão do exército japonês conhecido por ser um homem de pouca conversa e de ir direto ao que interessa. Hajime Saito também era um espião interno e monitorava atividades inimigas e outras inteligências, fato que instantaneamente coincide com a personagem de Watanabe, que, além de tudo, é um perito em defesa pessoal (dos sonhos).

Cillian Murphy é Robert Fischer, O Alvo. A vítima da equipe, bem treinado para se defender dentro da própria mente. Seu nome é uma alusão direta a Bobby (Robert) Fischer, enxadrista considerado o melhor do século XX. Vale notar que o totem de Ariadne é um peão de xadrez. Afinal, A Origem é ou não é um exércio de raciocínio bem elaborado, que nos apresenta a inserção de uma idéia na mente da vítima assim como o xadrez nos dá a possibilitade de incutir a dúvida no oponente?

A Narrativa




Don Cobb (Leonardo DiCaprio) é o líder de um grupo de espiões industriais que invade a mente das suas vítimas em busca dos segredos mais valiosos. As invasões são realizadas durante os sonhos, e os ladrões podem, inclusive, simular diferentes níveis de “realidade” dentro da mente na qual se encontram com a intenção de enganar o sonhador, fazendo com que este ceda os seus segredos.

Cobb se apresenta a Saito, logo na sequência inicial, explicando-o o conceito dos sonhos e, como um especialista, diz que poderia o treinar para se defender de prováveis invasores, mas, para isso, seria necessário compartilhar todos os seus segredos. No entanto, Saito percebe a armação e, num embate junto a Cobb, Arthur é morto, gerando um colapso dentro do sonho, até todos despertarem em um pequeno apartamento. O japonês, desapontado com a ineficiência dos ladrões, logo percebe, devido a uma falha do Arquiteto Nash (Lukas Hass), que todos se encontram em outro sonho.



É assim que, ao início da projeção, Nolan apresenta o principal conceito que desenvolverá durante as horas seguintes. Mas no sonho de quem os personagens trafegaram? É, relativamente, simples: Cobb, Arthur e Nash estão, após seguir Saito no “mundo-real”, dentro de um trem-bala. Ao induzirem o sono, os quatro se encontram no primeiro nível, que se mostra como o sonho de Nash. Induzidos mais uma vez ao sono, deixando o sonhador do primeiro nível para trás, Cobb e Saito ingressam no sonho de Arthur, o que prova ser verdade, pois este segundo nível entra em colapso após a morte do Point Man. Descobrimos, nesta sequência, que o sonhador, responsável pelo nível de sonho, deve permanecer no ambiente, podendo os demais embarcarem em outras camadas de sonhos dentro de sonhos.

A partir destas informações, podemos nos situar com maior precisão no enredo título: a inserção. Especialista em roubar idéias, Cobb precisa formar sua equipe para inserir um pensamento na mente de Robert Fischer, levando-o a dividir o império deixado pelo pai. É então que presenciamos a narrativa que pode deixar um pouco atordoados os espectadores menos atentos: Cobb, Arthur, Eames, Saito, Ariadne (a nova Arquiteta), e o químico especialista em sedação Yusuf (Dileep Rao), sedam Fischer em uma longa viagem de avião. Logo ingressam no primeiro nível, sonhado por Yusuf. Nesta camada, a intenção é implantar o início da idéia na mente de Fischer. Para isso, o sequestram, e Eames assume a identidade de Browning (Tom Berenger), um homem no qual o Alvo confia plenamente. O propósito final é levar Fischer a abrir um cofre no nível mais profundo do seu inconsciente, fazendo-o descobrir a germinação de uma idéia que, claro, deverá acreditar ser sua.

Porém, é necessário que Fischer acredite na inviolabilade do cofre e na existência de um segundo testamento, que anularia o primeiro, deixado pelo pai. Para isso, é Browning (na verdade Eames) que revela a existência do testamento, e Cobb o obriga a dizer, aleatoriamente, os primeiros números que surgem em sua mente.



Tendo estes números memorizados, todos, com a excessão de Yusuf (que, por ser o sonhador do primeiro nível, deve ali permanecer para manter a estabilidade), sedam-se novamente e embarcam no sonho de Arthur. É aqui que uma coerência muito bem realizada por Nolan é exposta: as cores básicas do sonho remetem, instantaneamente, àquelas do sonho que abre o filme, que também é abrigado por Arthur. E, percebemos, também, que ele permanece neste nível enquanto os outros ingressam ao terceiro nível.



Neste instante, Cobb se apresenta a Fischer (que já não lembra do sonho anterior) e revela que estão, em um sonho, ameaçados por ladrões. Então, oferecendo ajuda, pede que tente se lembrar o que os invasores poderiam estar procurando. Então, os números apresentados anteriormente reaparecem na forma de um número de telefone. Ficando convencido que aqueles números foram gerados pelo seu próprio inconsciente, Fischer crê que se trata, na verdade, do número de um quarto de hotel, sendo levado para lá por Cobb e sua equipe.

O Alvo, convencido de que está sendo guiado por projeções do próprio subconsciente, e sem desconfiar dos verdadeiros invasores, é, mais uma vez, levado a crer em Browning (mais uma vez falsificado por Eames), que revela ser um traidor. Perdido com a revelação, Fischer aceita a proposta de Cobb de ingressarem em um sonho de Browning para descobrirem o que ele estava tramando, sem saber que estaria adentrando na mente de Eames.

Ali, nesta camada de sonho, é que está o cofre. E, aberto com a combinação de números que agora julga ser sua, Fischer acreditará na idéia encomendada por Saito, julgando ser sua. Mas não acontece exatamente assim. Antes da abertura do cofre, Fischer e Saito (que já vinha ferido desde o primeiro nível) são mortos. Normalmente, a morte nos sonhos levaria a acordar um nível acima, mas, devido à forte sedação, isto faz com que o sonhador seja arremessado em um nível profundo, batizado por Cobb, de Limbo. Este nível seria um lugar não planejado por um Arquiteto, onde todos os ocupantes compartilhariam seus inconscientes caso Cobb e Mal não tivessem passado o equivalente a cinquenta anos ali, ocupando tudo com suas fantasias e memórias. E é no Limbo que, após se sedarem novamente, deixando, claro, Eames para trás, que Cobb e Ariadne encontram Fischer.



Até aí, fomos levados a conhecer cinco níveis (a realidade, e os sonhos de Yusuf, Arthur e Eames, além do Limbo), todos com ações paralelas e, logicamente, o tempo apropriado de cada um: dez horas de sono no “mundo-real” equivalem a uma semana no primeiro nível, alguns meses no segundo, e dez anos no terceiro. Este conceito é imprescindível para que compreendamos bem a história, e essencial para que os personagens possam praticar o “chute” (algo que leve ao despertar no nível superior, como a sensação de queda-livre ou submersão).

Enquanto Ariadne leva Fischer de volta ao terceiro nível (sincronizando um chute com a ressuscitação realizada por Eames “acima” – quando ele usa um desfribilador no corpo de Fischer, Ariadne o arremessa de uma grande altura, fazendo-o acordar próximo ao cofre), Cobb permanece no Limbo tentando convencer a sua projeção de Mal de que aquele mundo não é real, e descobrimos que ele já plantara, desastradamente, um idéia na mente de sua própria esposa. Isto faz com que, após o equivalente a décadas vivendo no Limbo, Mal acredite que a realidade é aquele lugar e, por achar estar sonhando e com desejo de voltar à vida que julgava real, suicida-se.

Em seguida, o processo de sincronização dos chutes realizado para despertarem na sempre um nível acima até à realidade é de um primor concebido por Nolan e de uma perfeição da montagem (de Lee Smith) impressionates. Cada um é obrigado a sincronizar o chute de forma que este ocorra frações de segundo antes do chute no nível superior. Para isso, são guiados por algo que atravessa os níveis: a música. Utilizada com toda força que lhe cabe, “Non, Je Ne Regrette Rien”, de Edith Piaf, é apropriadamente utilizada.

Cobb, decidindo confrontar a esposa, é apunhalado, mas, como está sob o forte efeito da sedação, volta a despertar no Limbo, o que lhe permite encontrar Saito. Este, por sua vez, como chegara ali antes e sofrera a ação do tempo dilatado, agora é um velho quase esquecido de todo o seu passado. O Extrator, então, tenta convencer o Turista a se matar, informando-o sobre a realidade daquele lugar e que, com o fim da sedação, a morte levaria ambos de volta à realidade. Saito projeta sua mão em direção à arma que se encontra à sua frente e, logo após, são vistos acordando no avião.



Ao final, Cobb, chegando em sua casa, rodopia o totem (um pião), que era da esposa, sobre um móvel, e vai ao encontro dos filhos. Caso o totem oscile e pare de rodopiar, ele estaria no mundo-real, caso contrário tudo não passaria de um sonho. E, plantando esta dúvida na mente do espectador, Nolan finaliza a projeção focalizando o giro do totem que, claramente, oscila, e surgem os créditos sem que possamos ver se o objeto parara de girar. Porém, é ainda possível escutar um som que pode indicar a queda do totem. Será?

Colhendo Coclusões


Apoiado em conceitos reais e explicados pela ciência, Christopher Nolan nos mostra o resultado de oito anos pensados por uma mente, até então, brilhante. Há quem compare A Origem com outras obras, principalmente Matrix, o que só é verdade se tomarmos como base o tema “realidade”. Afora, A Origem se torna superior por se tratar, sim, de algo fictício, porém, perfeitamente estruturado em bases e conceitos científicos. Enquanto isso, os fãs do cyberpunk consideram toda a trilogia dos irmãos Wachowski uma obra-prima, mesmo sendo esta baseada em conceitos reais mal interpretados.

Em mais, Nolan consegue estabelecer paralelos que, possivelmente, passam despercebidos. Somos apresentados, nem tão discretamente, à união entre ciência e religião. Seria Mal uma personagem inserida na trama, como uma projeção da mente do marido, sem nenhum motivo para discussão espiritual? Se não há motivo para essa discussão, por que o Limbo, sendo o último nível dos sonhos, é o lar de uma suicida? E por que todos se referem a este lugar como “lá embaixo”? E a frase mais questionável dita por Cobb à mulher: “Preciso deixar você ir.”

O cineasta, do mesmo modo, traça um forte paralelo para os sentimentos, tornando cada sensação uma questão racional, principalmente ao situar a culpa de Cobb, por ter indiretamente induzido sua mulher ao suicídio, como motivo para que esta surgisse como uma projeção de sua mente.

Em seus aspectos técnicos, A Origem é de uma perfeição assombrosa. A começar pela continuidade, é possível um olhar mais atento observar que a aliança de Cobb obedece uma lógica extremamente coerente, estando ou não em seu dedo anelar.

A montagem de Lee Smith, já comentanda anteriormente, inevitavelmente o fará concorrer mais uma vez ao Oscar (depois de Mestre dos Mares, e Batman - O Cavaleiro das Trevas).

Ainda, a trilha sonora de Hans Zimmer é destaque absoluto, dando a densidade apropriada a cada cena e, ao empregar o tema da “Non, Je Ne Regrette Rien” em meio à toda tensão, nos oferece um laço magistral, unindo sua composição à música de Piaf, que, afinal, é imprescindível à narrativa.

O figurino é lógico e coerente, oferecendo a cada personagem o princípio de sua personalidade: desde as roupas de colegial de Ariadne, passando pelos vestidos à moda Chicago de Mal, aos ternos sérios de Cobb.

A fotografia de Wally Pfister, mais uma vez ao lado de Nolan, é assaz eficiente, o que deverá lhe render, também, mais uma indicação da Academia.

Os efeitos visuais são precisos e muito bem desenvolvidos... E se deve ressaltar que nenhum deles é visto como figurante ou com o motivo fútil de embelezar a obra... Cada qual é emblemático e auxilia o desenvolvimento do roteiro.

Em se falando das atuações, infelizmente, creio, não veremos os protagonistas de A Origem com possibilidades de qualquer premiação. Com certeza, o motivo não é a má interpretação de qualquer um deles, pois todos, sem excessão, desenvolvem as personagens com habilidade, mas, sim, porque o que vemos nesta projeção é um trabalho em equipe direcionado à compreensão da trama... O que é dirigido brilhantemente por Nolan. Porém, vale ressaltar, com destaque, Tom Hardy.

Ao final restarão dúvidas, e as mais de duas horas ecoarão por algum tempo na mente do espectador. Teria Cobb retornado, realmente, à realidade? Estaria, Mal, certa em acreditar que o mundo-real é o Limbo? Mas, em meio a tudo isso, poderá surgir uma questão singular: Será que o trabalho da equipe era, somente, inserir uma idéia na mente do pobre Fischer? Ou seríamos as verdadeiras vítimas dentro de um sonho de Christopher Nolan?

Bons e ruins filmes para nós!


Saiba mais sobre o filme A Origem.


Por Sihan Felix

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