Screening Tests: o filme que você vê nas telas não era assim

Em 1980, um homem de vinte e poucos anos foi preso e condenado à prisão perpétua pelo assassinato brutal de uma vizinha. A irmã dele, convencida de sua inocência, decide cursar Direito para tirar o irmão da cadeia. Seu casamento acaba, os filhos sentem falta dela, não há vida social e poucas amizades resistem. Ela consegue se formar, sair da faculdade e, com muito esforço, provar a inocência e tirar o irmão da cadeia, 18 anos depois. Após seis meses em liberdade, ele cai de um muro e morre.A história é real, aconteceu nos Estados Unidos e foi contada pelo filme A Condenação, com Hilary Swank e Sam Rockwell (ótimos) no papel dos irmãos. O filme omite apenas um detalhe: a morte trágica do ex-presidiário. Em testes feitos com plateias antes do lançamento, a informação de que o injustiçado havia morrido de forma tão estúpida tão pouco tempo depois de ser libertado incomodou demais. O filme termina então, com os irmãos felizes para sempre. Esse tipo de alteração em filmes de Hollywood é comum.

 

O que acaba determinando como será o filme lançado são os screening tests, feitos quando o filme já está finalizado, antes do lançamento geral. As plateias dessas exibições especiais são montadas para refletir aspectos da população (no caso a norte-americana) e estimar como pode reagir o grande público, refletindo em mais bilheteria. Se a plateia-teste reagir mal, o filme volta para a sala de edição e, em muitos casos, para o estúdio de filmagem. Chato né? Concordo, e muitos filmes foram alterados e se tornaram mais "agradáveis" ao paladar do público assim, sem desafiar a zona de conforto da plateia.

 

Veja alguns casos:

Esse é um caso clássico. quem nunca se debulhou em lágrimas durante a Sessão da Tarde, vendo o pequeno Elliot dando adeus ao amigo de outro planeta em ET - O Extraterreste. ET tinha que voltar para casa, oras! Mas, a princípio, o final do filme era mais sombrio: ET simplesmente iria morrer. O filme com esse final foi mostrado às plateias-teste, que rejeitaram ferozmente a tragédia. Com o final mais suave, ET entrou pra história do cinema. 

 

De certa forma Sylvester Stallone deve muito de sua fama aos screening tests. No livro em que o filme foi baseado, o personagem morria no final e assim foi feito o primeiro corte de Rambo. A plateia-teste detestou, o final foi mudado e o personagem sobreviveu. Sobreviveu tanto que protagonizou outros três filmes, o mais recente deles em 2008, quando Stallone já contava 62 anos de vida. 

Martin Scorsese é obviamente um diretor respeitado há várias décadas, mas em 1990 ele teve que se submeter aos testes de audiência e colocar Os Bons Companheiros para julgamento. Mais de 40 pessoas saíram da sala nos primeiros 40 minutos do filme e outras relataram extremo desconforto na sequência em que o personagem de Ray Liotta atinge o limite no abuso de drogas. Mesmo a contragosto, Scorsese e sua fiel editora Thelma Schoonmaker reeditaram a parte final do filme, apressando a sequência de uso de drogas para não incomodar tanto a plateia. Convenhamos, não afetou o filme de forma negativa.  

Os testes de audiência foram feitos e Steven Spielberg estava bem tranquilo, pois além de prender a atenção dos espectadores, Tubarão estava causando sustos genuínos. Porém, o único grito ouvido em um dos testes foi na cena em que o tubarão aparece próximo ao barco dos três homens que tentam detê-lo - quando o filme já contava 80 minutos. Spielberg então adicionou uma outra cena com o tubarão aparecendo de repente e pronto: obteve dois gritos da plateia. Sucesso! 

Julia Roberts tornou-se uma estrela após esse filme, que praticamente toma para si a história da Cinderela. Mas não era pra ser assim: a personagem de Roberts é uma prostituta e Richard Gere http://cinema10.com.br/personalidades/richard-gere interpreta um milionário que a contrata para ficar com ele uma semana. No roteiro original de Uma Linda Mulher, Gere iria embora assim que o prazo acabasse, deixando Roberts de volta à vida nas ruas. Porém, a plateia-teste rejeitou o destino da pobre mocinha e os produtores foram obrigados a transformar o filme numa impossível história de amor. 

O final brutal de Se7en quase não foi para as telas, tamanho o desgosto causado. O astro Brad Pitt, cujo nome era importante para garantir interesse pelo filme, ameaçou abandonar o projeto caso o estúdio mudasse alguma coisa e prejudicasse a essência do roteiro. Com medo de perder seu astro principal, o estúdio concordou em manter o final "desagradável". Apesar disso, Se7en faturou 3 vezes mais do que custou apenas nos Estados Unidos e 10 vezes mais no resto do mundo.